Como consultar o Oráculo I Ching: o livro das Mutações!
Como diz o Budismo: a vida é impermanência. A vida é mudança.
Mas muitas vezes vivemos sem esta consciência, como se fosse possível nada mudar nunca.
Algumas mudanças são previsíveis e mesmo prováveis.
Outras mudanças acontecem de um dia para outro, de modo totalmente imprevisto e independente de nossa vontade.
E, às vezes, passamos por um verdadeiro vórtice de mudanças planetárias, como neste momento de pandemia do Covid-19.
Ao usar o I Ching participamos ativamente do processo de mudança, buscando sabedoria. E assim entramos em um diálogo com a mudança.
Mas, afinal, o que é o I Ching e como ele pode nos ajudar a ter mais sabedoria em nossos processos? Vamos descobrir neste artigo!
Índice
O que é I Ching?
O I Ching é tão antigo quanto a Bíblia. Tem ao menos três mil anos e foi a principal fonte do Confucionismo e do Taoismo. Sem dúvida, é o livro de sabedoria oracular mais complexo e sofisticado da humanidade.
Apesar desta imensa tradição no Oriente, o I Ching chegou relativamente tarde ao Ocidente: foi publicada há menos de cem anos a primeira tradução integral feita pelo sinólogo alemão Richard Wilhelm.
É um livro de difícil definição. O I Ching tem uma origem pré-literária e foi por muito tempo considerado um livro de filosofia sem práticas divinatórias. E, para muitos, é um guia espiritual.
Segundo o americano Stephen Karcher, um dos seus tradutores mais originais no Ocidente, o I Ching é ao mesmo tempo “um texto, um sistema divinatório e um “Caminho”, uma disciplina espiritual e imaginativa”.
Por mais de trinta anos, o psicanalista suíço Carl Gustav Jung se interessou pelo I Ching e via na técnica do oráculo chinês um modo para explorar o inconsciente.
Jung escreveu um famoso texto introdutório ao I Ching chamando-o de “monumento do pensamento chinês”.
Para Jung, atrás de um oráculo existe a ideia de que tudo o que acontece em um determinado momento tem inevitavelmente a qualidade peculiar daquele mesmo momento.
Neste prefácio ao I Ching, Jung criou as bases para a sua célebre teoria da sincronicidade.
“Para a sincronicidade, a coincidência dos acontecimentos, no espaço e no tempo, significa algo mais que mero acaso, precisamente uma peculiar interdependência de eventos objetivos entre si, assim como dos estados subjetivos (psíquicos) do observador ou observadores”.
“Supõe-se que qualquer coisa que aconteça naquele momento, pertence a ele como parte indispensável do quadro”. E dá um exemplo que à primeira vista parece até caricatural: “Se um punhado de fósforos é jogado no chão, eles formam o padrão característico daquele momento”.
Jung
Jung escreve ainda que o “I Ching a todo instante insiste no autoconhecimento”. E acrescenta: “este livro representa uma longa exortação a uma cuidadosa análise de nosso caráter, a atitude e motivações”.
Outro grande admirador do I Ching, o escritor Paulo Coelho o considera “um livro revolucionário” e o elogia por ser “interativo há três mil anos usando a linguagem binária antes do computador”.
I Ching significa em chinês o livro clássico da mutação e contém 64 figuras conhecidas como hexagramas.
Como escreve Gustavo Alberto Corrêa Pinto no prefácio a uma edição brasileira do I Ching, estes 64 hexagramas são quadros arquetípicos da mudança.
“Muda constantemente a natureza, porém sempre ao longo das mesmas estações. Nunca as mesmas flores, mas sempre a primavera. Os fenômenos são incontáveis e distintos uns dos outros, porém regidos, em suas tendências de mudança, pelos mesmos e constantes princípios”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
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I Ching: Hexagramas
Cada hexagrama do I Ching é formado pela combinação de oito trigramas que são denominados Ba Gua, um conceito fundamental da filosofia chinesa que em sua tradução literal significa oito trigramas ou oito mutações.
- O Baguá também é utilizado no Feng Shui, muito conhecido pela orientação em harmonização de ambientes.
Esses trigramas são as oito combinações possíveis das energias Yin (feminino) e Yang (masculino) em três linhas de duas tipologias (as quebradas ou maleáveis significam Yin; e as inteiras ou fortes representam Yang).
Os oito trigramas do Ba Gua clássico são tradicionalmente chamados de Céu, Terra, Água, Fogo, Vento, Lago, Trovão e Montanha.
São tão importantes no Oriente a ponto de alguns países os usarem em suas bandeiras: o Vietnam tem em sua bandeira o trigrama do Fogo e a Coréia do Sul estampa em seu símbolo nacional uma série de quatro trigramas – Céu, Água, Terra e Fogo.
O grupo de música brasileira instrumental Uakti que teve uma carreira de quase 40 anos dedicou um inteiro disco ao I Ching e pode ser ouvido aqui enquanto você lê o artigo 🙂
Oráculo I Ching – do amor ao autoconhecimento
O I Ching é um oráculo com mais de três mil anos de existência. Sua sabedoria está contida no Livro das Mutações: o mais antigo livro chinês.
Ao formular em modo claro, objetivo e direto uma pergunta sobre uma questão importante de sua vida neste momento de mudança ou de estagnação, o I Ching te ajuda a receber uma resposta!
O I Ching tem função filosófica e divinatória, nos trazendo respostas e questionamentos sobre a própria vida, com base nos elementos e forças da natureza.
Ideal para quem busca:
- Autoconhecimento
- Espiritualidade
- Evolução e desenvolvimento pessoal
- Em caso de dúvidas sobre decisões
- Para obter respostas e direcionamentos para o momento, seja no amor, saúde, profissão.
Como jogar I Ching
Nos três milênios de consulta do I Ching como oráculo foram usados diversos métodos de acesso às respostas como varetas, moedas e mais recentemente os softwares online.
Embora todas essas formas de consulta sejam válidas, a forma mais tradicional de consulta na china antiga era o uso de 50 varetas de caule de milefólio ou de bambu. Mas a partir da era cristã, o I Ching passou a ser consultado de maneira mais simples e menos ritual com simples moedas.
Defensores de uma consulta mais ritualística do I Ching, acreditam que a divisão e subdivisão sistemática das varetas de milefólio em conjuntos e subconjuntos exigia muita concentração e presença.
E ao usar este método lento e que exigia muito cuidado e atenção, era também um modo de preparar-se para a resposta do oráculo ao distrair e despistar assim o próprio ego e finalmente abrir-se às forças do inconsciente.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto descreve o grande respeito com o qual o livro das mutações e as varetas eram tratados na China antiga:
“Usava-se sempre um corte de seda virgem para envolver o livro e uma caixa de madeira (que, também, jamais tivesse servido a outra finalidade), para acondicionar as varetas. Assim, expressava-se o respeito e reverência para com o oráculo enquanto meio de expressão do inconsciente, do que há de mais verdadeiro, puro e essencial em nós”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
O método mais comum de consulta ao I Ching como oráculo hoje é o das moedas.
Como jogar I Ching com moedas
Lançam-se três moedas por seis vezes para obter os dois trigramas e, enfim, forma-se o hexagrama que corresponde a uma das 64 figuras do I Ching.
- Um dos lados da moeda terá o valor 2 e o outro lado terá o valor 3.
- A soma das três moedas indicará uma linha inteira yang (─) se for 7 ou 9; e uma linha interrompida yin (– –) se for 6 ou 8.
- Quando há ao menos uma soma com resultado 6 (yin) ou 9 (yang), a linha yang vira yin e vice-versa.
- E assim da figura primária nasce uma segunda figura chamada derivada.
Enquanto a figura primária corresponde ao momento presente a figura derivada pode se referir a um potencial futuro, as preocupações ocultas ou a uma situação do passado que criou a situação que se vive agora.
O próprio Jung em seu famoso ensaio comenta este fato das linhas formadas pela soma 6 ou 9 que provocam a criação de linhas com energias opostas em um segundo novo hexagrama:
“Segundo a concepção da antiguidade, as linhas indicadas por um seis ou um nove possuem uma tensão interna tão grande que faz com que se transformem em seus opostos, isto é, yang em yin e vice-versa.”
Jung
Stephen Karcher, tradutor de uma versão muito original do I Ching em inglês já traduzida no Brasil (“I Ching Total – Mitos para a Mutação”, editora Nova Era), lembra que as linhas yang e yin já são em si mesmas uma resposta do oráculo, antes mesmo de formar um dos dois trigramas:
“A resposta básica (entre a linha forte (estável, ─) e a linha maleável (mutante, – –) descrevia o tipo de postura a ser adotado em relação a um problema: tomar uma atitude, ser agressivo, impor sua vontade; ou submeter-se, permanecer onde estiver e adaptar-se ao que vier”.
Stephen Karcher
Além da figura primária e da figura derivada, outras figuras podem ser obtidas a partir dos dados revelados no lançamento casual das três moedas por seis vezes. Como por exemplo, a figura oculta que se obtém apenas com as linhas internas de cada trigrama que são duplicadas.
E deste modo, a interpretação ganha novos níveis de complexidade.
De acordo com a tradição, como dissemos, os 64 hexagramas são obtidos pela combinação dos oito trigramas – Céu, Terra, Água, Fogo, Vento, Lago, Trovão e Montanha.
Já numa outra sessão do I Ching, comentários associam estes 64 hexagramas aos Cinco Processos ou Momentos que segundo a tradição chinesa são Madeira, Fogo, Terra, Água, Metal.
Os dois trigramas que integrarão a resposta do oráculo à consulta são formados uma linha por vez de baixo para cima a partir do lançamento das três moedas por seis vezes.
“Todos os métodos de gerar as linhas de um hexagrama confiam no acaso ou na sincronicidade como algo além do seu controle consciente, que permite uma força, que não é a do ego, fazer a escolha”.
Stephen Karcher
O trigrama inferior assim gerado corresponde ao mundo interior do consultante enquanto o trigrama superior corresponde ao problema ou ao mundo exterior enfrentado neste momento por quem consulta o oráculo.
Outra simbologia importante do I Ching é que os 64 hexagramas podem ser vistos como pares:
“Os 64 gua ou diagramas de seis linhas constituem 32 pares. Desses, 23 pares ou 56 diagramas estão relacionados uns com os outros por um processo chamado inversão ou rotação: uma figura em um par se torna a outra quando é invertida ou girada em seu eixo central. Isto reflete o processo chamado HUA: mudança gradual, normal. É o normal na matriz”.
Stephen Karcher
“O outro, um grupo menor”, continua Karcher, “representa os “pares simétricos”. Eles não mudam quando girados ou invertidos.
Para efetuar uma mudança aqui, cada linha individual deve ser transformada ou convertida na sua oposta. Esses pares simétricos representam zonas de descontinuidade radical, nos quais o fluxo do tempo é desconectado, virado e reconectado de uma forma diferente.
Eles são negentrópicos; revertem entropia, recarregando uma situação conectando-a às fontes primais de energia.
Mas não se assustem com toda esta complexidade do I Ching!
Outra maneiras de como Interpretar I Ching
O Livro da Mutação também pode ser consultado rapidamente, apenas para se ter uma direção num momento em que se precisa de uma escolha imediata e certeira.
“O oráculo da Mutação é tradicionalmente usado de duas maneiras diferentes, porém, relacionadas. Ele é utilizado para fornecer respostas rápidas e concisas para problemas prementes, e também para fornecer um histórico e um conhecimento que lhe permitem entender a situação em profundidade, e assim gerar uma estratégia eficaz para ajudar em um planejamento a longo prazo”.
Stephen Karcher
Os sinais divinatórios de uma rápida consulta podem estar nos bordões clássicos do I Ching como “Palavras sabias! O caminho está aberto “(ji) e “Armadilha! O caminho está fechado“ (xiong).
Mas o clássico da mutação também exorta à reflexão e um bordão típico a este respeito diz: “Cuidadosamente, considere seu lugar nesse modelo e sua relação com ele”.
Outra chave para a interpretação é a de considerar os números cardinais dos hexagramas gerados e dos seus pares, os das figuras derivadas e os das ocultas e associar estes números aos acontecimentos da vida do consultante quando tinha aquela idade indicada pelos números dos hexagramas ou das figuras.
Aconselha o I Ching: “Olhe para as idades e os acontecimentos que essas figuras sugerem para conexões pessoais”.
“Estamos apenas começando a entender a maneira quadrimensional em que as imagens se movem por essa matriz de mutação e transformação, complexa e alusiva”.
Stephen Karcher
Paulo Coelho diz que o I Ching “é um conselheiro – não é um guia”.
O consultante deve ter a postura de quem busca a sabedoria.
I Ching – O livro das Mutações através da história
Na China antiga esta busca era representada por rituais:
“o consulente sentava-se sempre voltado para o sul, a região do Sol, da luz (Li, o trigrama do fogo, está situado ao sul, no arranjo do Céu Posterior), tal como o faziam os governantes quando concediam audiências. A posição externa simbolizava a atitude interna. Voltar-se para a luz significa voltar-se para o que permite ver e entender”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
Outro ingrediente do uso ritual do I Ching era o uso do incenso na China antiga durante a consulta do oráculo, como explica Corrêa Pinto:
“o incenso era usado durante a consulta, assim como em grande parte dos demais ritos. Era considerado elemento purificador, bem como representava a perseverança, pela constância com que queima. Antes de iniciar o processo de divisão das varetas, o consulente curvava-se três vezes e, tomando as cinquenta varetas em sua mão direita, passava-as três vezes pela fumaça do incenso, em movimento circular, no sentido horário”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
Já o escritor Paulo Coelho nos aconselha uma atitude ainda mais mística com a oração:
“Deve-se sempre rezar antes, pedindo a Deus que interfira na queda das moedas, e nos dê a orientação que estamos precisando no momento”.
Paulo Coelho
De qualquer maneira, a postura pela busca da sabedoria do consultante é indispensável tanto quanto ter um estado de alma aberto. Diz Corrêa Pinto: “aproximarmo-nos dele requer humildade, sinceridade e ardor”.
Aqui chegamos num ponto importante do I Ching: o da formulação da pergunta ao oráculo.
Tudo começa aquietando a mente e o coração e encontrando um lugar em que o consulente se sinta confortável para fazer a pergunta ao oráculo, como aconselha Stephen Karcher:
“encontre um local calmo. Suavemente aquiete a sua mente. Arrume o material que escolheu para a sua consulta”.
Stephen Karcher
E Karcher aconselha também a usar a imaginação:
“uma imagem tradicional para isso é imaginar-se em um pequeno barco de madeira, flutuando no calmo mar azul. Você suavemente flutua, se afastando até não mais enxergar a terra”.
Stephen Karcher
Corrêa Pinto lembra que:
“antes da consulta ao oráculo, a pergunta deve ser lapidada, cada aresta de imprecisão aparada, até que se chegue ao ponto em que só o núcleo essencial brilhe, claro e solitário”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
Na mesma direção, Stephen Karcher exorta à formulação da pergunta em modo claro e preciso:
“a sua entrada no mundo da Mutação se dá através de uma pergunta. Isto inicia o processo criativo de falar com o espírito e experimentar seus efeitos no que os sábios chamam de mente-coração (xin). A experiência básica quando se usa a Mutação é a sensação de ser visto e valorizado. Reflete o que o mundo tradicional chamava de amizade dos espíritos”.
Stephen Karcher
E Karcher acrescenta:
“o primeiro passo no processo é apresentar o problema como uma pergunta. Você deve levar um tempo nisso. Quanto mais clara a pergunta e maior a sua percepção dos pontos em questão, mais precisa e profunda pode ser a resposta da Mutação”.
Stephen Karcher
Ainda Stephen Karcher nos ajuda a formular as justas estratégias para formular a pergunta ao I Ching:
“formule a pergunta o mais claro possível. Baseie isto no que você quer fazer. Encontre o limite, o lugar onde você deseja fundir na incerteza. Uma formulação eficaz é: “Que tal se eu fizesse X? “, “O que aconteceria seu eu… “ ou “Qual deveria ser minha atitude em relação a…“. Se você estiver confuso sobre toda a situação, você pode pedir uma imagem: “O que está acontecendo aqui? Por favor, me dê uma imagem da situação? “. Se você estiver verdadeiramente amarrado a um dilema, pode pedir uma imagem para cada alternativa. Você também pode pedir uma estratégia: “Como posso melhor atingir X? “. A mutação vai lhe oferecer um símbolo que o torne consciente e o ajudará a se conectar com as forças ocultas ativas dessa situação, os espíritos do tempo”.
Stephen Karcher
Corrêa Pinto nos lembra que a pergunta ao oráculo deve conter apenas um tema:
“Se, numa questão, estão envolvidos dois ou mais temas, deve-se subdividi-la em tantas perguntas quantos forem os núcleos de significado intencionados. Assim, cada pergunta deve indagar por uma única coisa”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
Outro conselho que Corrêa Pinto nos deixa para formular a pergunta ao I Ching é que ela seja o mais curta e sintética possível:
“Quando se precisar falar muito para se dizer algo, é porque ou o saber ainda não alcançou sua plena maturidade, ou se está dissimulando, o que significa que se está procurando evitar que se faça o saber. A dissimulação é a ignorância que procura perpetuar a ignorância”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
Apenas a postura de respeito em relação ao I Ching e o comprometimento com o bem de todos e o bem de tudo ao formular a pergunta garantirá a útil e profícua resposta do oráculo, como escrever Karcher:
“A tradição diz que o livro responderá claramente a uma necessidade real, mas não se permitirá ser usado para o mal ou fins manipuladores. Há um espirito real, muito simpático, que deve ser tratado com respeito”.
Stephen Karcher
Corrêa Pinto lembra que a tradição considera o Livro da Mutação infalível:
“a formulação da pergunta tem um papel decisivo no êxito ou no fracasso da consulta (no sentido da compreensão ou não da resposta obtida). O oráculo, segundo a tradição chinesa, nunca falha. Suas respostas são sempre claras e precisas; porém o nosso entendimento é, muitas vezes, turvo e confuso. O oráculo sempre mostra o que é; nós, entretanto, muitas vezes não conseguimos ver o que ele nos mostra, pois não queremos ou não sabemos ver. Todas as barreiras e obstáculos à compreensão da resposta estão em nós e não no oráculo. Enquanto manifestação do inconsciente, o oráculo usa a linguagem simbólica, que é própria daquele, e não o discurso racionalizado que o consciente habitualmente articula. Para que o significado se aclare, teremos de aprender o modo de concatenação dessas imagens simbólicas, ao invés de insistirmos em tentar decodificá-las segundo padrões que lhes são estranhos”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
Stephen Karcher orienta o consultante a deixar a resposta do oráculo a ressoar em seu interior e não hesitar em fazer novas perguntas:
“Considere, cuidadosamente, a resposta do oráculo: deixe ela se movimentar no seu coração, como diz a tradição. Porém, se novas perguntas surgirem, não hesite em fazê-las. A mutação convida a este tipo de diálogo. Lentamente, transforma a maneira como pensamos sobre os nossos problemas, nos levando cada vez mais longe no mundo dos símbolos”.
Stephen Karcher
Corrêa Pinto escreve que
“o estudo do I Ching é um trabalho constante, no qual, mais que um acúmulo de conhecimento, se processa uma crescente conscientização do ignorado”. E nos convida a considerar o livro da mutação como um ser vivo: “o oráculo não é uma máquina de informações, mas um ser vivo, que encerra a suprema sabedoria e compaixão”.
Gustavo Alberto Corrêa Pinto
O oráculo nos ajuda a ver uma situação por um ângulo novo muitas vezes inédito e mais profundo, como nota Stephen Karcher :
“a tradição da Mutação atua, primariamente, como uma ajuda para tomar decisões. Reformula sua consciência de uma situação, abre e aprofunda, coloca-o em contato com os lugares onde a energia criativa é ativa e está disponível. Mediante o processo da consulta, interagimos com as forças ocultas, formando o momento (shi), e descobrimos as maneiras mais eficazes de agir”.
Stephen Karcher
A tradução do oráculo chinês feita por Stephen Karcher foi reunida no volume “I Ching Total – Mitos para a mutação” e este é um projeto de tradução bastante ousado no qual Karcher diz ter usado uma “linguagem divinatória” e que “apesar de se basear em um extenso trabalho de estudo, esta é uma tradução poética, e não histórica”.
A ligação de Stephen Karcher com o I Ching aconteceu através de um sonho premonitório: ele sonhou com uma livraria que com o tempo pôde fisicamente visitar na cidade Vancouver, no Canadá.
E ali encontrou a tradução do I Ching feita pelo sinólogo alemão Richard Wilhelm e traduzida para o inglês pela junguiana Cary Baynes. Esse encontro mudou a sua vida para sempre.
Neste grande projeto de tradução, Stephen Karcher buscou explorar “os conjuntos de mitos e rituais, que se escondem atrás das figuras da Mutação, de forma igualmente eclética e iconoclasta, fundindo os significados arcaicos, clássicos e filosóficos”.
Segundo Karcher, ao usarmos o I Ching deixamos de ser vítimas da mudança: “ao usar a Mutação, participamos ativamente neste processo criativo, em vez de sermos suas vítimas passivas e relutantes”.
“Após a mudança de tal paradigma”, escreve Karcher,
“O mundo é diferente. Não podemos voltar atrás. O que podemos fazer, entretanto, é tentar reconectar o novo mundo em que vivemos com o mundo atemporal de onde viemos”.
Stephen Karcher
Stephen Karcher nos escreve que no chinês antigo não há uma palavra para o acaso no sentido moderno de ação sem sentido ou como acontecimento aleatório. E acrescenta:
“Toda coincidência tem um sentido. O acaso para os antigos sábios era a capacidade de agir espontaneamente ou sob a influência de uma força não vista. Na divinação, esse acaso ou coincidência é o veículo do espírito, uma chance para o seu destino falar com você”.
Stephen Karcher
Para Karcher, a reposta do oráculo chinês à pergunta do consulente “ensina você o destino (ming) que o Céu lhe confere e o ajuda a seguir a natureza inata (jing)”. E acrescenta: “Conectar-se com ou estar “no” Caminho é experimentar o significado, alegria, conexão, liberdade, compaixão e criatividade”.
“Usando a Mutação, de acordo com o tempo, seja grande ou pequeno”, escreve Karcher, “e permanecer em contato com o Caminho, permite-lhe acumular “DE”, o poder de se realizar, de se tornar quem você supõe ser, assim preenchendo o seu destino inato”.
E Karcher atenta para o paradoxo que existe entre o nosso tempo que rejeita e recusa a ideia de sacrifício, conceito que por outro lado é inerente e implícito na mutação:
“Não há ideia mais estranha à sensibilidade moderna do que a mítica do sacrifício: nenhuma ideia é mais importante para entender a função da mutação.“ E conclui: “estas são épocas em que somos chamados para sacrificar nossa velha identidade, a fim de participar do advento do novo.”
Stephen Karcher
Como consultar I Ching com a tradução correta?
Qual devemos usar? Uma tradução que use como base o trabalho do sinólogo alemão Richard Wilhelm?
Este é um trabalho fundamental do ponto vista histórico e que passou pela prova dos nove da retro tradução como nos diz o próprio Richard Wilhelm: “do alemão traduziu-se novamente para o chinês, e só aceitávamos a tradução depois de recriado o sentido total do texto”.
Ou escolher usar a tradução arqueológica, mítica e mitológica, imaginativa, poética e divinatória de Stephen Karcher?
A resposta nos dá a americana Belinda Doveston que tem no youtube o canal I Ching Café: devemos usar ambas as versões!
Ela compara as duas versões e diz que a tradução de Richard Wilhelm é uma abordagem mental, clara, estruturada, yang e projeta a parte esquerda do cérebro. Para ela, talvez seja este o melhor texto para iniciar um percurso dentro do I Ching.
Enquanto que por outro lado, a tradução de Stephen Karcher, segundo Belinda Doveston tem uma abordagem feminina, yin, arquetípica, arqueológica, mitológica e, simbólica, intuitiva e representa a parte direita do cérebro.
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